Descongelamento da propina ou congelamento do progresso?

Voltamos a observar mais um ataque ao ensino superior de Fernando Alexandre. Olhar para a Educação como despesa, e não como investimento, é esvaziar a sua importância para o desenvolvimento do país.

Foto
Megafone P3 Matilde Fieschi
Ouça este artigo
00:00
03:21

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Veio o Ministro da Educação Fernando Alexandre, em entrevista à RTP 3, reafirmar a vontade do Governo de descongelar a propina do Ensino Superior, dizendo que “não é aí que se garante a equidade”. Começo por perguntar, senhor Ministro, é aumentando a propina que garante a equidade?

Assistimos, de 2015 a 2020, uma redução sucessiva do valor anual da propina. Desde esse momento que esta redução cessou, ficando a propina congelada até então nos 697 euros anuais. Este decréscimo, no panorama político-estudantil, é considerado largamente benéfico, uma vez que contribuiu para a igualdade de oportunidades e para o alargamento do acesso ao ensino superior, ainda que insuficiente para que se garanta um acesso generalizado. No entanto, contrariamente aos milhares de estudantes que o afirmam, vivendo o Ensino Superior e as suas consequências económicas diariamente, vem o Ministro dizer que a redução das propinas “foi um erro”.

Anteriormente, o Ministro afirmou que “o Governo tem o dever de ter uma política clara sobre a estratégia de financiamento do Ensino Superior”, e aquando de polémicas derivadas a um possível aumento já em 2025, o mesmo assegurou a manutenção do mesmo valor anual de propina “este ano e no próximo ano lectivo”, após a incessante manifestação dos Estudantes contra. Vem agora quase contradizer-se, frustrando as expectativas tanto dos futuros como dos presentes Estudantes de Ensino Superior.

E vejamos, o argumento para o descongelamento é sempre o mesmo, o apoio na Acção Social. Mas com bolsas mínimas de 871€, que apoio é que garantimos aos Estudantes superiores? Não há aulas de literacia financeira que consigam ensinar os Estudantes a gerir os 174 euros que lhes sobram de bolsa para o ano inteiro, pagas as propinas “reduzidas”. Esconder esta verdade através da Acção Social da DGES e das próprias instituições subfinanciadas é um típico argumento circular: aumenta-se a propina, aumentam-se as bolsas, e o dinheiro no final do mês continua insuficiente, tanto para o Estudante, que não pode pagar o curso, tanto para a Instituição que não suporta o seu próprio custo.

No contexto económico-social em que vivemos, as declarações de Fernando Alexandre são, no mínimo, repreensíveis e censuráveis. Temos estudantes a viver em Pousadas da Juventude, em quartos de quatro camas sem secretária, ou em quartos sem janela com um valor absurdo. Apenas 44% dos Estudantes com dificuldades económicas ingressam no Ensino Superior. Temos mestrados a 7000€ anuais a serem ministrados em Instituições de Ensino Superior públicas portuguesas. Tudo isto torna inadmissível que seja esta preocupação deste Governo, que com a opção de avançar, procura retroceder.

Pergunta-se qual é a política “clara” deste Governo quanto ao financiamento do Ensino Superior, porque com as declarações de Fernando Alexandre, conclui-se que a política de financiamento do Ensino Superior são os Estudantes em si. É à custa dos Estudantes que se quer financiar o Ensino Superior.

Ter um Ministro da Educação que manifestamente olha para o Ensino Superior como uma despesa, e não como o Investimento cultural, científico e social que é, faz-me prever que tempos difíceis se avizinham. Os Estudantes, resilientes como sempre e já peritos neste assunto, estão prontos para combater este aumento e esta perspetiva puramente económica, que esvazia o Ensino Superior e a sua génese.

Claramente não com este Governo, mas avançaremos, por um Ensino Superior democrático, justo, gratuito.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários