Novo estatuto da carreira científica aprovado no Parlamento
Actualização do diploma, em vigor há 25 anos, era reivindicação de cientistas e sindicatos há vários anos. Estatuto será agora discutido na especialidade antes de ser aplicado definitivamente.
A proposta do Governo para actualizar o estatuto da carreira científica, uma reivindicação com 25 anos, dado que não é revisto desde 1999, foi aprovada na generalidade pelo Parlamento nesta sexta-feira. O diploma seguirá agora para discussão na Comissão de Educação e Ciência onde ainda deverá receber alguns ajustes antes de ser finalmente aplicado – já em 2025.
Além da proposta do executivo de Luís Montenegro, foram também aprovados os projectos do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda, ambos referentes à revisão deste estatuto – e com diferenças face à proposta do Governo. O estatuto da carreira de investigação científica está em revisão desde 2023, quando o Governo de António Costa também aprovou as linhas-mestras para um novo estatuto que não chegou a avançar devido à demissão do antigo primeiro-ministro.
A proposta agora em cima da mesa baseia-se precisamente na que foi deixada pelo executivo do Partido Socialista. A secretária de Estado da Ciência Ana Paiva argumentou, na sessão parlamentar desta sexta-feira, que isso acontece “porque não viemos deitar abaixo, mas sim construir mais alto”. No seu discurso de abertura para apresentar a proposta, considerou que o diploma vigente está “desactualizado e não responde às necessidades actuais do sistema científico nacional”, sublinhando uma visão de “valorização da população jovem para a ciência, a inovação e o empreendedorismo” que o estatuto apresentado pelo Governo terá.
Uma das alterações do estatuto para a carreira científica apresentado pela primeira vez em Outubro por Fernando Alexandre, ministro da Educação, Ciência e Inovação, é a possibilidade dos cientistas gerirem empresas em fase de arranque (as startups) ou prestarem consultoria em empresas que surjam da investigação realizada.
Como o PÚBLICO já tinha referido, a proposta do Governo da Aliança Democrática prevê que a aplicação das regras para a carreira de investigação científica sejam de “aplicação facultativa” nas instituições em regime de direito privado, o que permitirá às instituições privadas sem fins lucrativos (constituídas em muitas faculdades portuguesas para simplificar a contratação ou a gestão de projectos) escusarem-se a seguir o estatuto da carreira de investigação no que concerne à progressão na carreira, modo de contratação por concurso ou mesmo na avaliação de desempenho a aplicar.
Uma das salvaguardas no diploma face a esta “aplicação facultativa” é que o seguimento do estatuto da carreira científica pode ser “imposto pelo projecto público financiador”, ou seja, pode constar das obrigações imputadas pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) às instituições que financia. A proposta do Partido Socialista também define que a aplicação aos privados deve ser facultativa, já a do Bloco de Esquerda defende a obrigatoriedade da sua aplicação.
Para o Governo, como tem vindo a ser repetidamente afirmado por Fernando Alexandre, este novo estatuto será uma solução para a precariedade. Nas justificações prévias à proposta do novo estatuto lê-se isso mesmo: “Este novo instrumento permitirá, também, reduzir a precariedade e promover a estabilidade e a previsibilidade laboral de doutorados e dos respectivos vínculos, bem como das suas linhas de investigação.”
Este novo estatuto substituirá, quando for aprovado na especialidade (e depois novamente na generalidade pelo Parlamento), um diploma com 25 anos e que se encontra desactualizado. A sua actualização é uma promessa renovada por todos os executivos desde o Governo de Passos Coelho (2011-2015).
A carreira de investigação científica poderá ter um novo salto nos próximos dois anos, com a integração de 1500 investigadores contratados ao abrigo do programa FCT-Tenure, através do qual a FCT apoia financeiramente (e num período até seis anos) a contratação de doutorados para as carreiras em instituições de ensino superior e centros de investigação. Esta integração, no entanto, dividir-se-á entre a carreira de docência e de investigação científica. O programa lançado já em 2023, terminou agora a sua primeira edição (com 1104 vagas atribuídas para as instituições abrirem concursos) e contará com mais 400 vagas na segunda edição, em 2025.
Nas últimas décadas, a contratação de cientistas tem sido alicerçada sobretudo em bolsas de investigação e contratos a prazo financiados através da própria FCT.
Na sessão parlamentar desta sexta-feira, também foi aprovada uma proposta do Partido Socialista que recomenda ao Governo a abertura de concursos para contratar doutorados para a carreira de investigação científica na FCT, permitindo pôr termo às diferentes condições salariais e contratuais dos técnicos doutorados da instituição.