COP29: um acordo tímido a pensar já em Belém

Para serem bem-sucedidas, as políticas climáticas devem ser ambientalmente robustas e economicamente viáveis, transformando a sustentabilidade num motor de inovação e crescimento.

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A 29.ª Conferência das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (COP29) terminou na última semana de Novembro. Após um início conturbado, a COP trouxe alguns resultados positivos, embora poucos sintam razões para celebrar.

Desde o anúncio, surgiram discussões sobre a integridade das negociações. O Azerbaijão tem uma economia fortemente dependente do petróleo, o que não se alinha ao papel do anfitrião na presidência das negociações e levanta questões sobre possíveis conflitos de interesse. Receia-se que países com economias baseadas no petróleo a presidir à COP comprometam a objectividade e eficácia das políticas climáticas, já que interesses económicos frequentemente conflituam com medidas de descarbonização. Além disso, a presidência do anfitrião molda políticas, agendas, debates e prioridades.

Estes receios foram mitigados na primeira semana com o acordo para operacionalizar o artigo 6.º do Acordo de Paris, estabelecendo um quadro internacional para o mercado de créditos de carbono. Esta estratégia, já vista na COP28 no Dubai, visava garantir uma vitória inicial. Contudo, o principal resultado deste ano foi o compromisso de triplicar o financiamento para países em desenvolvimento para 300 mil milhões de dólares anuais. Porém, aponta-se que são necessários 1300 mil milhões anuais, o que gerou tensões em grupos junto dos países menos desenvolvidos dos pequenos estados insulares, que abandonaram as sessões de debate. A versão final do acordo foi anunciada no domingo, mais de 35 horas após o prazo oficial, com críticas de países como Nigéria e Índia.

Outro dos pontos na agenda foi a concretização dos objectivos de eliminação gradual dos combustíveis de energia fóssil, já incluída no documento final da COP anterior. No entanto, com esforços mínimos da presidência em resolver este tema e com a resistência de países mais ligados ao petróleo, esta discussão foi adiada para o próximo ano.

Há dois pontos positivos a destacar: o aumento da transparência na monitorização dos progressos dos países em relação às metas climáticas, definindo-se a elaboração de um relatório de progresso em 2028 e revisão em 2035, garantindo alinhamento e responsabilização dos países nas suas contribuições climáticas. A COP também deu novo impulso aos Planos Nacionais de Adaptação, focados nos países menos desenvolvidos e estados insulares, fortalecendo a resiliência de infra-estruturas e práticas agrícolas, essenciais para enfrentar os crescentes desafios climáticos.

Estes não são resultados que transformam radicalmente a política climática, mas são o possível. Alguns dirão que falta coragem, outros argumentarão a ausência de uma visão comum. Sem uma visão integrada, será difícil alcançar mais do que resultados tímidos e declarações redondas. Na nossa perspectiva, a eficácia da política climática deve basear-se em duas premissas fundamentais: assegurar que se considerem os interesses de blocos económicos específicos e garantir que as medidas de sustentabilidade reforcem a competitividade.

Mais do que perseguir um consenso global (quase impossível), é crucial adoptar uma abordagem que reconheça diferenças regionais e desafios específicos de cada bloco económico. Focarmo-nos nos interesses regionais permite alinhar esforços climáticos às dinâmicas políticas e económicas, como acordos comerciais e políticas regionais, facilitando a definição de padrões de energia limpa e mecanismos de financiamento conjunto. Assim, alcançam-se compromissos de forma mais ágil, metas realistas e implementação adaptada às necessidades locais. Políticas que consideram estas especificidades promovem maior adesão e eficácia. Este foco evita percepções de penalização económica e estimula sectores estratégicos a inovar de forma sustentável.

Adoptar esta abordagem cria exemplos regionais bem-sucedidos que podem ser replicados globalmente. A transição energética europeia, por exemplo, pode inspirar outros blocos com desafios semelhantes. Mais importante, ao tornar a sustentabilidade uma vantagem competitiva, promove-se a adopção mais ampla de práticas sustentáveis, mobilizando a economia além de esforços isolados. Para serem bem-sucedidas, as políticas climáticas devem ser ambientalmente robustas e economicamente viáveis, transformando a sustentabilidade num motor de inovação e crescimento. Assim, a transição sustentável torna-se uma escolha ética e estratégica.

É, aliás, para a COP30, a realizar-se em Belém, Brasil, que todos os olhos estão virados. Depois de anos seguidos de presidências com claros conflitos de interesse que, para muitos, descredibilizaram o modelo de funcionamento das COP, Belém surge como promessa de mudança, num contexto económico e geopolítico totalmente imprevisível. Uma nova administração americana mais hostil ao tema, o prolongar da guerra na Europa, uma possível recessão na Alemanha, marcarão sem qualquer margem de dúvida a COP30. Contudo, a urgência climática torna cada vez mais evidente a necessidade de tomar decisões sobre o clima. O ano de 2024 deverá ser o primeiro em que o aumento da temperatura média global fica acima de 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais – limite considerado por muitos como o máximo aceitável para minimizar os impactos das alterações climáticas.

Todos reconhecemos a importância de transformar os compromissos climáticos em acções concretas. Como agentes de sustentabilidade, temos um papel crucial em pressionar os governos para adoptarem políticas eficazes que reflectem os acordos estabelecidos. É essencial que trabalhemos juntos para garantir que a promessa de mudança em Belém se torne uma realidade palpável e eficaz.


O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico