“Temos um sistema bem montado para alertar as pessoas em caso de inundação”, garante ministra do Ambiente
Maria da Graça Carvalho passou a manhã de quarta-feira a ver o que a APA tem feito para enfrentar os efeitos das alterações climáticas e assinalou que esta é uma “área prioritária” para Portugal.
“Ninguém está preparado para uma grande catástrofe, mas podemos diminuir o impacto, prever e dar o alerta a tempo” – a frase foi dita pela Ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, no dia que dedicou a visitar a sede da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), no concelho da Amadora, e a ver a monitorização que tem sido realizada pelas diferentes equipas da entidade. Esta foi a forma de responder a uma pergunta que muitos portugueses terão feito a propósito das recentes cheias em Valência, que causaram a morte a mais de 200 pessoas: estará Portugal preparado para inundações que já têm sido e podem ainda ser mais agravadas pelos efeitos das alterações climáticas?
Na manhã desta quarta-feira, quem entrava na Centro de Controle de Inundações da APA era recebido com um anúncio no ecrã: “Gestão de Cheias e Inundações”. Seguir-se-ia um desfile de apresentações sobre o trabalho de diferentes equipas da instituição, com uma plateia de peso, que incluía, à cabeceira, a ministra do Ambiente e o presidente da APA, José Carlos Pimenta Machado. “Vai ser um dia para mostrar o que a APA faz”, notava Pimenta Machado.
Uma das apresentações em destaque foi a do Sistema de Vigilância e Alerta de Recursos Hídricos (SVARH), que faz a previsão e alerta para salvaguarda de pessoas e bens ao nível das cheias e inundações. “O ciclo da água é onde as alterações climáticas têm maior impacto. É onde conseguimos visualizar o impacto das alterações climáticas”, assinalou Felisbina Quadrado, directora do Departamento de Recursos Hídricos.
Ao longo da explicação do funcionamento, Felisbina Quadrado destacou uma informação que tem vindo a ser mencionada, a propósito das cheias em Valência: Portugal tem 63 áreas com risco potencial significativo de inundações, podendo afectar 105 municípios e mais de 102.905 habitantes em território continental.
Também notou que a monitorização no terreno para medição dos caudais depende das 800 estações da rede hidrometereológica distribuídas pelo país e que, por semana, duas delas são vandalizadas. Anualmente, a manutenção desta rede tem 1,2 milhões de euros. Nesse seguimento, a ministra do Ambiente apelou: “Pedimos muito à população para não vandalizarem essas estações. Com a medição de caudal, ajudam a prever as zonas com mais problemas.”
No meio desse pedido, fez questão de abordar a preparação de Portugal na resposta a uma possível grande inundação. “Temos um sistema bem montado para alertar as pessoas em caso de inundação”, garantiu, assinalando que existe uma coordenação entre o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), a APA e a Protecção Civil nacional e regional. Para o mostrar, disse que, nas recentes inundações no Algarve, a APA lhe passou informação de quais poderiam ser os sítios com mais problemas e que contactou os presidentes de câmara desses locais. No final, as previsões coincidiram com a realidade, contou.
Quanto a investimentos previstos, não adiantou nada para além dos já conhecidos e da manutenção de 1,2 milhões de euros da rede hidrometereológica. Contudo, fez questão de dizer: “É uma área prioritária. Não será por falta de financiamento.”
As cheias em Valência foram também directamente mencionadas pela ministra, que salientou que tudo o que se sabe “é muito preliminar”. Antes de se pronunciar com detalhe sobre o assunto e atribuir culpas, disse preferir saber quais são os resultados dos relatórios que estão a ser feitos sobre o que aconteceu. Mesmo assim, considerou que “a regionalização prejudicou um pouco” as comunicações. “Terá havido um atraso a nível regional no alerta às populações”, notou Maria da Graça Carvalho, para referir que em Portugal não deverão existir problemas desse género.
Prioridade: não construir em leito de cheia
Mesmo assim, as causas da catástrofe são bem mais complexas e também indicou que a zona onde as cheias aconteceram é muito urbanizada, com pouco espaço para a absorção de água e que houve construção em leito de cheia, bem como emparedamento de rios. “Em Portugal ainda há muito disso e estamos a olhar para essas situações”, afirmou. Mas quais são mesmo as zonas mais críticas? Maria da Graça Carvalho mencionou apenas que “são muitas as zonas críticas no Tejo, em Coimbra, [ou seja] muitas zonas do litoral e de rio”. E alertou: “Há zonas em Lisboa, de leito de cheia, que não podem ter construção porque pode ocorrer o que aconteceu em Valência. Não quer dizer que não seja em Lisboa inteira [que isso acontece], mas tem de se ter cuidado para não acontecer o que aconteceu em Valência.”
Sempre ao lado da ministra, Pimenta Machado destacou que “a primeira prioridade tem de ser não construir em leito de cheia”, o que está ligado a um eixo da APA para o risco de inundação que é a prevenção. Logo a seguir, indicou que deve ser feita uma protecção, como dar espaço aos rios. E, por fim, deve pensar-se na preparação dos sistemas de informação e na aprendizagem com o que aconteceu no passado. “Só se gere o que se conhece”, disse.
Nesse sentido, a ministra do Ambiente fez ainda questão de “esclarecer” o recente e já abordado grupo “Água que Une”, que foi uma iniciativa do primeiro-ministro, Luís Montenegro, e tem envolvido os ministérios do Ambiente e da Agricultura, com a meta de desenvolver uma estratégia de planeamento da água. O grupo inclui representantes da Águas de Portugal, da APA, da Direcção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e da Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva. Maria da Graça Carvalho explicou que o grupo está a fazer uma análise à forma como se gere a água, reunindo vários sectores. Alguns dos objectivos passam pela modernização da gestão da água ou a diminuição das perdas de água.
A governante adiantou que também foi pedido ao grupo que analisasse o que “é urgente” fazer a nível de novas infra-estruturas, mas que as prioridades serão a poupança da água, a limitação das perdas, a optimização do peso da água e, só em último lugar, as tais novas edificações. Questionada sobre se o plano inclui a construção ou intervenção em barragens, a ministra não confirmou. “No estudo é que vão perceber se é preciso alguma barragem”, disse, que tem elementos da APA ou das Águas de Portugal. “A barragem é uma prioridade final. Só se constrói uma barragem ou dessalinizadora se não se consegue poupar e aproveitar bem as infra-estruturas existentes.” Resultados ou decisões do estudo desse grupo devem ser apresentados pelo primeiro-ministro entre o final de 2024 e o início de 2025, disse ainda.