Reacções à eleição de Costa: da “magnífica decisão” às bicadas de César a Montenegro
Marcelo Rebelo de Sousa realça compromisso de Costa com a construção europeia. Carlos César critica o Governo, mas Montenegro foi o único a quem Costa agradeceu na primeira mensagem depois da eleição.
De Marcelo Rebelo de Sousa, o grande entusiasta, há meses, da possível nomeação de António Costa para presidente do Conselho Europeu, veio uma das maiores congratulações agora que a escolha se confirmou: na página oficial da Presidência da República escreveu, na quinta-feira à noite, que a eleição é "uma magnífica decisão para a Europa e também para Portugal".
"O compromisso pessoal e o trabalho já demonstrado de António Costa para com a construção europeia e no que representa de solidariedade e progresso é uma garantia de que o Conselho Europeu ficará em boas mãos, pelo que o Presidente da República lhe apresenta os votos de parabéns e de felicidades nas futuras funções, a bem de todos nós", lê-se ainda na nota publicada.
O chefe de Estado considera que a decisão do Conselho Europeu sobre o seu próximo presidente, mas também a escolha de Ursula von der Leyen para continuar na liderança da Comissão Europeia e a de Kaja Kallas para chefe da diplomacia da União Europeia, "abrem caminho à continuidade do regular funcionamento das instituições europeias", pelo bem do "projecto comum de construção de um futuro em conjunto, em paz e em bem-estar social". Ao contrário de António Costa, que já está eleito, as duas novas dirigentes europeias terão ainda que passar pelo crivo do Parlamento Europeu.
Depois dessa reacção por escrito, Marcelo Rebelo de Sousa insistiu nos elogios de viva voz nesta sexta-feira e elencou os desafios a que António Costa terá que ajudar a União Europeia a dar resposta. "Manter a Europa unida em relação à Ucrânia; recuperar economicamente; aprovar as perspectivas financeiras para os próximos anos; acompanhar a execução dos PRR e da Next Generation (em Portugal o PT2030); tratar das relações com o mundo - continente africano, América Latina e acompanhar resultado das eleições americanas para graantir que não há uma guerra económica com os EUA", descreveu o Presidente.
A que somou o combate às alterações climáticas, a aplicação do pacto para as migrações e asilo e da lei sobre inteligência artificial. "Os desafios que tem a Europa exigem uma sensibilidade de diálogo, de compreensão e de ajustamento... e isso tem o presidente António Costa", disse Marcelo, lembrando que tinha que ser alguém "aceite pelos conservadores do PPE, pelos liberais, mas também pela direita mais radical. E ser alguém com boas relações no mundo, com capacidade de conhecimento dos dossiers (...) Ele era a solução ideal."
Ainda na noite de quinta-feira, numa ligação por vídeo com a conferência de imprensa em que foi anunciada a sua eleição, António Costa fez vários agradecimentos, nitidamente lendo as mensagens. "Quero, antes de mais, agradecer a confiança que os membros do Conselho depositaram em mim ao me elegerem presidente do Conselho Europeu", afirmou, em francês. "É um prazer estar aqui hoje com Ursula von der Leyen e Kaja Kallas e fazer parte desta equipa em breve. São ambas duas excepcionais cidadãs europeias e tenho a certeza que a nossa colaboração será muito bem-sucedida para servir a Europa e os cidadãos europeus", acrescentou em inglês. Costa irá reunir-se com as duas nomeadas nesta sexta-feira à tarde em Bruxelas, pelas 14h30 de Lisboa.
Regressando ao francês, deixou ainda os "melhores votos para o resto do mandato" de Charles Michel à frente do Conselho Europeu, a quem sucederá em Dezembro. Já em portugês, fez apenas um agradecimento: "Permitam-me que diga algumas palavras em português para agradcer ao Governo português e ao primeiro-ministro Luís Montenegro todo o apoio que deu nesta minha candidatura."
Socialistas elogiam Costa, PCP recusa "ilusões"
Por seu lado, Pedro Nuno Santos fez uma publicação na rede X onde escreveu apenas “Um enorme orgulho para Portugal e para o Partido Socialista. Parabéns, António Costa!”, acompanhado de um vídeo de 30 segundos com imagens de António Costa com líderes de países europeus e das instituições da União Europeia, entrecortadas com outras em que aparece com o seu sucessor.
Ainda no PS, o presidente Carlos César congratulou-se com a eleição na sua página no Facebook, mas não resistiu a uma referência crítica ao Governo, mesmo depois de todos os rasgados elogios e da defesa intransigente que Luís Montenegro fez de António Costa no debate quinzenal desta semana.
“António Costa é o novo presidente do Conselho Europeu! Tenho uma grande satisfação, também pessoal, que assim tenha acontecido. É o reconhecimento das capacidades políticas e diplomáticas do antigo líder do PS. Junta-se, num alto cargo internacional, a outro socialista português, António Guterres. Parabéns Portugal!”, assinalou Carlos César. Que não se coibiu de acrescentar que “o Governo da AD lá cumpriu as suas obrigações, apoiando, como não podia deixar de o fazer, a candidatura do anterior primeiro ministro”. “Imagino como isso lhes deve ter custado. Contrariados, mas… ‘é a vida’!”, ironizou.
Quem também recusa ilusões, mas desta vez sobre o próprio António Costa, é o PCP. Em comunicado, o partido que em 2015 abriu o caminho ao então líder do PS para assumir o poder em Portugal afirma ser uma “ilusão admitir que o titular de qualquer um dos principais cargos em distribuição, independentemente da personalidade que o ocupe ou da família política a que pertença entre as que os dividem entre si, altere o essencial desse processo e projecto” político da União Europeia.
Em comunicado, os comunistas dizem também ser uma “ilusão maior ainda se se alimentarem expectativas de que, para lá do juízo político sobre a pessoa em causa, daí possam resultar vantagens ou ganhos reais para a afirmação dos interesses nacionais e para uma relação liberta da submissão e subordinação do País às imposições da União Europeia”. E insistem na necessidade de lutar pela “manutenção do principio da unanimidade” das decisões, o contra a diminuição das transferências da UE para Portugal designadamente ao abrigo da política de coesão e as “pressões e chantagens associados ao Pacto de Estabilidade e à Governação Económica da UE”.
Da Madeira chegou a saudação do centrista José Manuel Rodrigues, presidente da Assembleia Legislativa regional: “Quando altos responsáveis da União Europeia querem minimizar a política de coesão, reduzindo a sua importância e financiamento, é bom ter no Conselho Europeu uma pessoa que conhece bem as inestimáveis mais-valias dessa coesão, nomeadamente para as regiões ultraperiféricas, como a Madeira”, afirmou, citado pela Lusa.
E, dos Açores, foi José Manuel Bolieiro, presidente do Governo regional que já felicitou Costa e salientou, em comunicado, o "enorme desafio que terá pela frente no quadro político europeu" e destacou a sua experiência.
Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa e ex-comissário europeu, assinalou o "momento histórico", realçando que Portugal tem pela segunda vez um dos dois cargos mais importantes da Europa, e apontou a "experiência" de Costa como governante, eurodeputado e autarca.
Ventura, a voz a remar contra a maré
No Parlamento, André Ventura fez questão de separar o político do homem António Costa: ao primeiro deixou críticas e ao segundo desejou “pessoalmente, não politicamente, as maiores feliciades no desempenho do cargo”. Antes, a condenação: “Não podemos compreender como é que, se [Costa] era uma má opção para Portugal, pode ser uma boa opção para a Europa", afirmou o líder do Chega numa referência ao apoio que o Governo da AD deu ao ex-primeiro-ministro socialista nesta eleição. "É um contrassenso que partidos anti-socialistas possam estar hoje a apoiar António Costa para o Conselho Europeu, como acontece com liberais e sociais-democratas."
"Não podíamos estar mais distantes do que entende António Costa sobre o que deve ser o projecto europeu", afirmou, apontando como exemplos a luta contra a corrupção, a ideia sobre ter as fronteiras da Europa abertas ou não à imigração e a política de segurança comum. E saudando Giorgia Meloni por ter votado contra a eleição de Costa.
Já a deputada única e líder do PAN pediu que António Costa "não se esqueça" dos grandes desafios do combate às alterações climáticas com a Agenda 2030 e de "não deixar ninguém para trás em matéria social", tendo Inês Sousa Real lembrado que o partido fez um caminho com o PS em matéria de defesa animal.
"É um cargo que prestigia Portugal, à semelhança do que tem ocorrido com outras personalidades portuguesas", afirmou, por seu turno, o presidente da Associação Industrial Portuguesa em comunicado. "A AIP deseja que o seu desempenho possa contribuir para fortalecer a coesão da UE e a defesa dos valores da democracia liberal.
Macron, Scholz e os equilíbrios políticos da União
A nível internacional, o Presidente francês Emmanel Macron deixou, na rede X, uma mensagem colectiva onde sublinha que os nomes mostram que se escolheu "a experiência e o reflexo dos equilíbrios políticos da nossa União, ao serviço da nossa agenda estratégica". O mesmo fez o chanceler alemão Olaf Scholz que os considerou "um sinal importante". "Com eles podemos avançar bem e rapidamente", acrescentou.
De África chegam as saudações de Cabo Verde e a Guiné-Bissau. O primeiro-ministro de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva antevê que Costa vai ter "um papel determinante" no futuro da União Europeia e da sua relação com África e elogiou o seu perfil. "É uma pessoa que faz pontes e tem experiência, é perspicaz e inspira confiança neste momento de relações que precsam de ser facilitadas, mesmo dentro da Europa", afirmou o governante citado pela Lusa.
Já o chefe de Estado da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, numa nota deixada no site da Presidência, considera que a eleição reforça "o papel de Portugal no cenário internacional" e elogia as suas "capacidades de liderança e habilidade para enfrentar desafios futuros".