Centros de tratamento de diabetes vão poder recorrer a empresa que ficou em segundo lugar no concurso de bombas de insulina
Suspensão preventiva por parte do Infarmed deve-se a alerta que chegou do Reino Unido. Em Portugal há relatos de que, de vez em quando, equipamentos apresentam alguns valores discrepantes.
Os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) revelaram nesta segunda-feira que os centros de tratamento de diabetes vão poder recorrer a outra empresa, enquanto o Infarmed mantiver a “suspensão temporária” que aplicou às bombas de insulina inteligentes da Medtrum. Esta foi a empresa que ficou classificada em primeiro lugar no concurso público internacional adjudicado a 9 de Maio de 2024 para o fornecimento dos novos equipamentos.
Em causa está o facto de os dois maiores lotes deste concurso (com 1233 e 743 destas novas bombas de insulina) terem sido adjudicados à empresa Medtrum, cujos aparelhos, segundo escreve na edição de hoje o Jornal de Notícias, foram objecto de um alerta de risco por parte de uma associação de diabetologistas inglesa e a sua utilização estar suspensa preventivamente por decisão da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed).
Ao PÚBLICO, o Infarmed esclarece que em Portugal estes dispositivos apenas foram disponibilizados à APDP - Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, para serem utilizados em doentes, no âmbito de um programa limitado de "testes de usabilidade", com estreito acompanhamento dos médicos, considerando sempre a fase de adaptação necessária nestes dispositivos mais complexos. "Decorrente dessa utilização, a APDP comunicou alguns incidentes ocorridos, os quais não tiveram consequências para os doentes. No entanto, e por ainda não terem sido apuradas as causas concretas dos incidentes reportados, considerando a informação disponibilizada, existem riscos relacionados com a sua utilização, nomeadamente possíveis situações de hipoglicemia ou de hiperglicemia", pelo que, como medida de precaução, foi decidido suspender toda a restante comercialização,"enquanto não forem apuradas as causas dos incidentes ocorridos e adoptadas as medidas correctivas adequadas".
"Estes riscos foram identificados na sequência da obtenção de valores discrepantes de glicose com o sistema de monitorização da glicose (constituído por sensor e transmissor) quando comparados com os valores obtidos através de determinações de glicemia capilar", respondeu por escrito o Infarmed.
Ao PÚBLICO, João Raposo, director clínico da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP) disse que há pelo menos dez doentes que estão a utilizar estas bombas ao abrigo dos testes de usabilidade e que, “de vez em quando, apresentam alguns valores que são discrepantes”. O responsável compreende a decisão preventiva do regulador do medicamento e apela a uma decisão rápida para que mais doentes possam começar a beneficiar destes equipamentos de nova geração.
Contactados pelo PÚBLICO, os SPMS esclareceram que “a suspensão da comercialização de dispositivos médicos é uma competência do regulador (Infarmed), que visa a protecção e segurança do doente” e que, “tratando-se de uma suspensão temporária e não definitiva, os centros de tratamento podem recorrer ao concorrente classificado em segundo lugar para os dois primeiros lotes, até à clarificação. O lote 3 não apresenta qualquer tipo de situação de suspensão”, pelo que os 28 centros de tratamento reconhecidos no país podem desde já avançar com os contratos para a aquisição destas bombas para serem usadas pelos doentes diabéticos que estão identificados. O segundo classificado no concurso dos lotes 1 e 2 foi a Vital Aire.
Segundo os SPMS, a divisão em lotes deveu-se à necessidade de aumentar a concorrência e a atractividade do mercado português. Até à realização deste concurso, existia apenas uma empresa a actuar em Portugal com este tipo de dispositivo médico (a Medtronic), pelo que os SPMS decidiram dividir o concurso em três lotes: um primeiro com 1233 unidades; um segundo com 743 (ambos ganhos pela Medtrum); e um terceiro de 466 bombas (que foi ganho pela Tandem). O critério de adjudicação de cada lote foi o preço, revelaram os SPMS.
João Raposo, director clínico da APDP, confirmou que a associação já foi contactada pelo Programa Nacional para a Diabetes da Direcção-Geral da Saúde para uma reunião no dia 1 de Julho, na sequência desta situação. Espera que o Infarmed e os SPMS encontrem rapidamente uma solução para ultrapassar este problema, uma vez que este “é um investimento necessário” e com vantagens para o tratamento dos doentes e para os serviços de saúde, uma vez que estes aparelhos medem os níveis de glicemia e ajustam automaticamente a dose de insulina.
“O Infarmed está a fazer o que tem de fazer. Mas quanto mais depressa se encontrar um plano B, melhor”, disse, lembrando que este é um processo que já leva alguma demora, uma vez que o objectivo era que o concurso estivesse concluído até ao final de Março. O objectivo do anterior Governo era que, até 2026, 15 mil doentes diabéticos passassem a utilizar estes equipamentos.
Segundo o Infarmed, o fabricante encontra-se a proceder à investigação destes incidentes, acompanhada de monitorização da autoridade do medicamento, no sentido de serem apuradas as causas, com vista à adopção de outras medidas que possam ser consideradas adequadas. "O INFARMED, I.P. encontra-se ainda a recolher informação deste dispositivo junto da Rede de Autoridades Competentes da União Europeia, e junto da Autoridade Competente Britânica, sobre a sua eventual utilização nos respectivos países". escreve.
No passado dia 12, a associação de diabetologistas britânica (Association of British Diabetologists) emitiu um alerta sobre os dispositivos da empresa Medtrum, alegando que alguns utilizadores tiveram reacções adversas, incluindo risco acrescido de hipoglicemia, o que terá suscitado esta suspensão preventiva por parte do Infarmed.
Texto actualizado às 20h23 horas para inclui a resposta do Infarmed