Defesa de António Costa diz que não foi confrontada com escutas em que este interveio
Conversas foram divulgadas esta semana pelo canal de televisão CNN, tendo levado a Procuradoria-Geral da República a anunciar a abertura de um inquérito para investigar as fugas de informação.
O advogado de defesa do ex-primeiro-ministro António Costa, João Cluny, garante que quando o cliente foi inquirido pelo Ministério Público, em finais do mês passado, no âmbito da Operação Influencer, não foi confrontado com qualquer escuta telefónica em que o próprio tivesse intervindo.
Daí que o defensor diga desconhecer o conteúdo das conversas que a CNN divulgou esta semana, nomeadamente um resumo de um telefonema ocorrido a 5 de Março do ano passado entre João Galamba e António Costa sobre a necessidade de afastar a então presidente executiva da TAP, Christine Ourmières-Widener, por motivos políticos, na sequência da polémica atribuição de uma indemnização de 500 mil euros a uma ex-administradora da companhia aérea, Alexandra Reis.
No dia seguinte, de facto, o ministro das Finanças, Fernando Medina, anuncia a demissão da gestora, mas alega que tal se ficou a dever a justa causa, algo que a ex-CEO da TAP sempre contestou, tendo interposto inclusive uma acção a pedir uma indemnização ao Estado.
“António Costa foi ouvido no âmbito de um inquérito que se encontra sujeito a segredo e a defesa não foi confrontada nem teve acesso a nenhum dos elementos que estão a ser divulgados. Pelo que não podemos fazer qualquer comentário sobre os mesmos”, afirma o advogado João Cluny.
Não é estranho que Costa não tenha sido confrontado com essas gravações que o apanharam a falar com pessoas que estavam sob escuta na Operação Influencer, já que a maioria das dezenas de conversas validadas pelo Supremo não aparenta qualquer relevância criminal, nem apresenta sequer qualquer ligação aos factos que estão agora em investigação. Este caso centra-se no alegado favorecimento de um megaprojecto para a construção de um centro de armazenamento de dados digitais, uma pequena parte do qual já está de pé, em Sines. Esta terça-feira, a Procuradoria-Geral da República adiantou que abriu um inquérito para investigar as fugas de informação.
O processo que visa António Costa foi aberto no Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça, fez na passada segunda-feira oito meses, devido ao facto de, enquanto primeiro-ministro, o político gozar de um foro especial.
Entretanto, como Costa se demitiu, o procurador responsável pela investigação considerou que o caso devia transitar para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), onde começou a ser investigado o processo principal, o mesmo que, em Novembro do ano passado, levou à detenção de cinco pessoas, duas das quais próximas do então primeiro-ministro.
Trata-se de Diogo Lacerda Machado, considerado um dos melhores amigos do político, e do seu então chefe de gabinete, Vítor Escária, na posse do qual foram encontrados 75.800 euros em dinheiro na sua sala de trabalho, no Palácio de São Bento.
A investigação a Costa continua, contudo, a estar separada do caso principal, tendo até uma procuradora titular distinta dos que estão a dirigir o inquérito principal. Ao contrário deste último, está em segredo de justiça interno, o que significa que nesta fase nem os suspeitos têm acesso a ela.
Já a investigação principal, que também corre no DCIAP, apenas se encontra em segredo de justiça externo, tendo sido consultada por várias das defesas dos nove arguidos do caso, que, contudo, só no final de Março conseguiram, por intermédio do juiz de instrução, aval para terem acesso a todos os volumes do caso. O que tem sido noticiado são elementos constantes dos 21 volumes e dos nove apensos que o caso tinha na altura em que foram realizadas as buscas e as detenções, em Novembro passado, e que os advogados consultaram no tribunal para poderem responder ao recurso apresentado pelo Ministério Público às medidas de coacção aplicadas pelo juiz Nuno Dias Costa.
Recorde-se que este magistrado decidiu que todos os arguidos deviam sair em liberdade – o Ministério Público pediu prisão preventiva para dois dos cinco – considerando que não estavam indiciados dos crimes de corrupção e de prevaricação. O ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, ficou apenas sujeito a entregar o passaporte, enquanto o advogado Diogo Lacerda Machado, amigo de António Costa, teve de prestar uma caução de 150 mil euros. A empresa Start Campus, promotora do megaprojecto em Sines, teve de apresentar uma caução de 600 mil euros.
As medidas de coacção aplicadas a Escária e a Lacerda Machado, os únicos que recorreram delas, foram anuladas pelo Tribunal da Relação de Lisboa em Abril passado. Os juízes desembargadores consideraram que os factos apurados até ao primeiro interrogatório "não são, só por si, integradores de qualquer tipo criminal", também não reconhecendo a existência de qualquer perigo que justifique a aplicação de medidas de coacção.