Mais uma volta, mais um atraso. Nos últimos dez dias, representantes de quase 200 países reuniram-se em Bona para o encontro dos chamados órgãos subsidiários da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC), um encontro que acontece todos os anos no final da Primavera e onde se acertam as bases para as negociações da Cimeira do Clima (COP), que este ano acontece em Bacu, no Azerbaijão, em Novembro.
A palavra-chave das negociações climáticas este ano é financiamento, tendo como um dos pontos centrais o esperado acordo sobre o Novo Objectivo Colectivo Quantificado (NCQG) para suportar a acção climática. Depois da grande promessa de começar a abandonar os combustíveis fósseis e do acordo sobre o fundo de perdas e danos selado na COP28, no Dubai, é altura de pôr em cima da mesa os meios necessários para essa ambição.
Só que esta quinta-feira, no último dia da agenda da SB60, a conferência de imprensa dos presidentes dos órgãos subsidiários, marcada para as 11h, acabou por ser adiada. À hora a que enviamos a newsletter, a reunião plenária conjunta para ouvir declarações das partes, agendada inicialmente para o início da tarde, começou já depois das 19h. À semelhança do que acontece nas COP, as reuniões SB não foram ainda suficientes para chegar a conclusões na hora marcada.
A rede Global Strategic Communications Council (GSCC) resumiu desta forma o que se passou: "Que quinzena! Deli atingiu os 50°C e a hegemonia do Primeiro-ministro Modi vacilou. A extrema-direita ganhou em grande nas eleições europeias. Macron arriscou o seu futuro político em Paris. Em Londres, o primeiro-ministro Sunak salta de gafe em gafe. Na África do Sul, o ANC lutou pelo seu futuro político. A Organização Mundial de Meteorologia (OMM) alertou para o facto de que vamos ultrapassar os 1,5°C antes de 2030. Os cientistas do Copérnico afirmaram que 2024 será o ano mais quente de sempre. E em Bona? Os enviados do clima fizeram o que sempre fizeram: discutir, gabar-se, atrasar, arrastar. Tranquilizadoramente previsível."
Apesar das noites longas e pouco sono, houve poucas conclusões no ponto mais crítico: o dinheiro necessário para a acção climática. Neste momento, não há acordo sobre o montante necessário, o chamado "quantum". Houve algumas propostas: o Grupo Africano pede que se atinja cerca de 1,3 biliões de dólares [1,2 biliões de euros] anuais até ao final da década, o Grupo Árabe sugere cerca de 1,1 biliões de dólares [1,02 biliões de euros] (entre fundos públicos e privados), a Índia recomenda um bilião de dólares [932 mil milhões de euros]. Para referência: a OCDE calcula que apenas em 2022 os países mais ricos tenham conseguido chegar à meta de 100 mil milhões de dólares (cerca de 93,2 mil milhões de euros) de financiamento climático (sim, dez vezes menos do que os montantes em cima da mesa).
Os países menos desenvolvidos alertam que não conseguem avançar se não tiverem meios para fazer investimentos a longo prazo, algo muito difícil quando os empréstimos a que podem aceder têm sempre juros demasiado altos. O que se pede não é apenas a generosidade dos países mais ricos: é responsabilidade pelo impacto que as formas de produção dessa riqueza tem no clima do planeta, afectando de forma desproporcional outras nações menos desenvolvidas.
E em Bona, no final das contas, não se conseguiu ainda sequer chegar a acordo para que o NCQG contenha, por exemplo, um capítulo sobre o fundo de perdas e danos. Afinal, se não vier daí o dinheiro para apoiar as comunidades vítimas de catástrofes climáticas, de onde virá o dinheiro?
"É difícil ignorar a desconexão entre os apelos ao aumento da ambição e a falta de progressos no centro de conferências", descreve o relato diário feito pela Earth Bulletin Network (EBN), resumindo as contradições desta SB60. "Se os países não levarem a sério as mensagens do Global Stocktake, acabam-se as nossas hipóteses de nos mantermos dentro do limite de 1,5 graus Celsius", resumiu um dos delegados em Bona.
"O grande número de questões não resolvidas prepara-nos para duas semanas agitadas em Bacu", remata Gaia Larsen, do think tank World Resources Institute. Até lá, dependerá da sociedade civil em cada país pressionar os seus governos (em particular os do Norte global) para, quando enviarem os seus representantes para a COP29, o fazerem com consciência de que o tempo está a esgotar-se para agir a nível global - seja quais forem os custos. Afinal, já se sabe, é mais barato prevenir do que remediar.