Protecção dos cavalos-marinhos em Portugal é insuficiente, alertam investigadores

As áreas marinhas protegidas apenas cobrem cerca de 20% do habitat estimado dos cavalos-marinhos em Portugal, e mesmo estas “conferem baixos a moderados níveis de protecção”.

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Um cavalo-marinho-de-focinho-comprido (Hippocampus guttulatus) Mario Rolim
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As áreas marinhas em Portugal e em Espanha são insuficientes para proteger os cavalos-marinhos, concluíram investigadores do MARE-ISPA, num estudo divulgado esta terça-feira que revelou baixos níveis de protecção e de conhecimento dos habitats.

De acordo com o trabalho publicado na revista científica Global Ecology and Conservation, as áreas marinhas protegidas apenas cobrem cerca de 20% do habitat estimado em Portugal continental, e menos de 12% na frente atlântica de Espanha. Menos de 0,5% do habitat estimado para as duas espécies de cavalos-marinhos que ocorrem na frente Atlântica da Península Ibérica – o cavalo-marinho-de-focinho comprido (Hippocampus guttulatus) e o cavalo-marinho comum (Hippocampus hippocampus) – são áreas de protecção total, ou seja, onde não há actividade humana.

"Os investigadores acreditam que estes valores são sobrestimados, uma vez que a cobertura das Áreas Marinhas Protegidas confere baixos a moderados níveis de protecção, permitindo em muitos casos o uso de redes e armadilhas de pesca, que capturam os cavalos-marinhos de forma acessória", afirmou, em comunicado, o Instituto Universitário (ISPA).

A grande maioria das áreas marinhas, explicam os investigadores, "não contempla medidas específicas para a protecção" destes animais nos planos de gestão. "Isto quando existem planos de gestão", alertaram os autores do estudo.

"É absolutamente fundamental criar medidas de protecção para estas espécies e dotar as Áreas Marinhas Protegidas de recursos humanos, financeiros e técnicos para que se possam gerir as actividades e a biodiversidade de uma forma sustentável", refere o coordenador do estudo, Gonçalo Silva, citado em comunicado.

Espécies na lista vermelha

Neste estudo, a partir de registos anteriores, "foi possível estimar o habitat favorável para os cavalos-marinhos", explica a primeira autora do estudo, Friederike Peiffer. Os cavalos-marinhos vivem normalmente em zonas costeiras onde existe o maior impacto de actividades humanas, ficando por isso "muito susceptíveis à poluição, à pesca acessória e à perda de habitat".

As espécies foram incluídas na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), bem como na Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagem Ameaçadas de Extinção (CITES) e na Convenção de Berna, sublinharam os investigadores.

Recentemente, explicam os cientistas do ISPA, foi aprovada uma resolução no congresso da UICN que visa a conservação de singnatídeos (cavalos-marinhos, marinhas e dragões-marinhos), que enfatiza o impacto das actividades humanas nos habitats críticos, como as pradarias marinhas, e outras "zonas de extrema importância para as fases juvenis destas espécies e que se encontram ameaçadas em toda a Europa".

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Cavalo-marinho comum (Hippocampus hippocampus), presente na Ria Formosa Mario Rolim

"Assim, urge implementar as directrizes que esta resolução define, nomeadamente a de recolha de informação do estado das populações de singnatídeos bem como promover activamente a sua conservação", apelam os investigadores.

Em Portugal, foi aprovado em 2021 o regime jurídico aplicável à protecção e à conservação de algumas espécies vulneráveis, entre as quais os cavalos-marinhos e outros singnatídeos, atribuindo um regime de protecção para estas espécies.

Pouca informação

No país, acrescentam os cientistas, "sabe-se muito pouco" sobre a distribuição dos cavalos-marinhos, sendo as populações da Ria Formosa as mais estudadas. "Na última década, a abundância sofreu uma redução na ordem dos 90%", devido sobretudo a pressões causadas pelo homem.

No resto do país, advertiram, "não há estudos que permitam inferir sobre as tendências populacionais". O presente estudo confirma que os estuários do Tejo e do Sado, a par da Ria Formosa, são os locais mais importantes para os cavalos-marinhos em Portugal.

O estuário do Tejo, onde recentemente foi descoberto um núcleo de cavalos-marinhos de interesse ecológico e para a conservação (mais precisamente na baía da Trafaria, em Almada), surge como "um hotspot de cavalos-marinhos".

A bióloga Friederike Peiffer destaca ainda o papel do conhecimento ecológico local e da ciência cidadã, através da partilha do conhecimento de actores-chave como os pescadores e centros de mergulho, mas também de observações de cidadãos comuns", que partilham as suas imagens com data, fotografia e local em plataformas online como iNaturalist, BioDiversity4All ou iSeahorse e "permitem que estas observações possam ser utilizadas por cientistas para compreender melhor a distribuição das espécies".

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