Vivas para os pediatras empáticos com os pais, especialmente os de primeira viagem

Lembrei-me que os pediatras têm de ser pessoas mesmo muito especiais, porque o seu papel vai muito além do cuidado médico de um paciente pequenino.

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Os pais têm de ter bem presente que a Internet não substitui anos de estudo e prática clínica EDUARDO MOSER/SANDRADESIGN
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Querida Ana,

Coitados dos pais nas primeiras doenças dos seus primeiros bebés. Como avó, o que mais me comove, é ver como são apanhados de surpresa pelo impacto que o sofrimento das suas crias tem sobre eles. Descobrem que é mesmo verdade, que de boa vontade os pais tomavam sobre si as dores dos seus filhos.

A primeira vez que li acerca de neurónios-espelho, os neurónios que nos permitem colocarmo-nos realmente no lugar do outro, fiquei fascinada. Graças à ressonância magnética foi possível “fotografar” o cérebro em ação e perceber que, por exemplo, perante o sofrimento de alguém muito próximo, acendem-se dentro de nós os mesmos centros de dor. Quando o outro apanha, por exemplo, um choque elétrico, é como se a corrente também cruzasse o nosso corpo. Ana, repara, não é imaginar o que o outro sente, é sentir de facto, com a mesma intensidade. Mas sabes do que suspeito, que se a prova tivesse sido feita com filhos doentes e os seus pais, resultaria não só uma dor em espelho, mas um sofrimento largamente ampliado. Genuinamente pior do que o do próprio.

Enquanto estava a pensar nisto, lembrei-me que os pediatras têm de ser pessoas mesmo muito especiais, porque o seu papel vai muito além do cuidado médico de um paciente pequenino. Aos olhos de um profissional experiente parece seguramente desproporcionada a ansiedade com que os pais acorrem com um filho que “só” tem febre alta, geme com uma dor de barriga, ou vomitou com a tosse. Para os especialistas são “banalidades”, mas para os pais, sobretudo para os de primeira viagem, é uma aflição sem fim, aterrorizados pelo medo de que seja mais do que aquilo que está à vista, incapazes de esperar pacientemente que passe. Afinal, qual é a aflição de que o Manelinho não coma há dois dias, se está gordo que nem um texugo? Ou quem é que estranha que a Joaninha chore ininterruptamente se tem a boca cheia de aftas, e nem sequer suporta a chucha? Ou que esteja “murcha” se arde de febre?

Pois, Ana, percebe-se a tentação de repreender os pais, criticando-os por serem demasiado nervoso, mas o que alguns esquecem é que, ainda por cima, uma grande parte destes pais estão por conta própria. Não têm pais/avós experientes por perto, ou mesmo tendo-os, não os “certificam” como qualificados, não têm irmãs ou cunhadas, nem tão pouco acesso a um pediatra que responda a uma mensagem com indicações e palavras tranquilizadoras. Mas também não podem entupir as Urgências, com casos sem gravidade! Certo, mas a questão está exatamente aí — é que para eles é urgente. A Linha Saúde 24 é uma grande aposta, mas a solução tem de estar nos médicos de família, nas enfermeiras de família, com quem se constrói uma relação de confiança, alguém que os conhece, e conhece a criança.

Ninguém deseja que os profissionais fiquem tão “histéricos” como os pais, numa empatia que não leva a nada, mas sim que passem ao estádio seguinte, o da compaixão — a compaixão de um pediatra vale ouro porque ajuda os pais a tornarem-se mais confiantes, mais resilientes e, a médio prazo, mais autónomos e independentes. Concordas comigo?


Querida Mãe,

Concordo em absoluto. Um bom médico de família ou pediatra pode ser uma mais-valia gigante para aquela criança, mas também para todos nós como sociedade. E não há-de ser só o nosso bom senso, já que o primeiro-ministro anunciou esta semana que a saúde familiar será um dos eixos do programa de emergência para a saúde, porque também é uma decisão inteligente a nível económico!

A aposta tem de ser nesta relação de confiança entre médico e doente, o que não é linear já que, principalmente na parentalidade, existem filosofias e teorias diferentes que vão para lá do conhecimento estritamente médico. E se é verdade que os médicos precisam de estar cada vez mais abertos a ouvir e a explicar, saindo do “pedestal” onde durante tantos séculos foram colocados, também é verdade que nós, enquanto pais e enquanto doentes, temos de ter bem presente que a Internet não substitui anos de estudo e prática.

Paralelamente — e sei que a mãe vai adorar ouvir isto —, os pais não se podem isolar do resto da família e dos amigos, e fazem bem em ouvir os avós, mesmo que não sigam todos os seus conselhos, sem se esquecerem que se a dor dos seus filhos tem sobre eles um impacto tão grande, é boa altura de tomarem consciência de que os seus próprios pais estão a sentir o mesmo, por eles, e pelos netos. E, além do mais, uma canja de galinha faz bem a tudo.

Beijinhos


O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. As autoras escrevem segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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