A Europa não larga o futebol (II)

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Este texto é uma continuação deste: A Europa não larga o futebol (I)

Afirma o Advogado-Geral, quanto à liberdade de circulação de trabalhadores: “Não restam dúvidas quanto ao carácter restritivo de todas as disposições controvertidas, como demonstra o facto de nenhuma das partes no presente processo tentar questionar esse carácter restritivo. Com efeito, as disposições que prevêem a responsabilidade solidária do novo clube pelo pagamento da compensação por incumprimento do contrato devida pelo jogador profissional ao seu antigo clube em caso de rescisão antecipada do contrato sem justa causa são susceptíveis de desencorajar ou dissuadir os clubes de contratarem o jogador por receio de exposição a um risco financeiro.

O mesmo se aplica à sanção desportiva que consiste na proibição de inscrever novos jogadores a nível nacional ou internacional, durante dois períodos de inscrição completos e consecutivos, bem como na não-emissão do [CIT]. Na prática, esta sanção pode impedir um jogador de exercer a sua profissão num clube situado noutro Estado‑Membro. O que importa é o facto de os jogadores serem, efectivamente, impedidos de se mudarem para clubes de outros Estados‑Membros. Foi precisamente o que aconteceu no caso em apreço: o jogador, que possui nacionalidade francesa e exerce uma actividade remunerada, tencionava começar a trabalhar na Bélgica, Estado de que não era nacional. As disposições controvertidas impediram‑no, efectivamente, de o fazer”.

Prossegue. “Nos termos do artigo 101. °, n.º 1, TFUE, são incompatíveis com o mercado interno todos os acordos entre empresas, decisões de associações de empresas e práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados‑Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno. A conjugação das disposições controvertidas conduz ao seguinte cenário: o artigo 17.° do RETJ estabelece que, logo que um jogador rescinda um contrato sem justa causa, deve ser paga uma compensação e são aplicadas sanções desportivas graves. Além disso, nos termos do ponto 8.2 do anexo 3 do RETJ, esse jogador não receberá o CIT que permite a um clube convocá‑lo para um jogo”.

“Por outras palavras, as consequências da rescisão de um contrato sem justa causa por um jogador são tão drásticas que é altamente improvável que um jogador opte por esta via. As disposições controvertidas foram concebidas para exercer um efeito dissuasor e inibidor nos jogadores. O mesmo se aplica aos clubes potencialmente interessados em aliciar jogadores propondo‑lhes novas oportunidades enquanto o respectivo contrato ainda está em vigor. O "preço" de tal operação seria extremamente elevado”. “Assim, pela sua própria natureza, as disposições controvertidas limitam a possibilidade de os jogadores mudarem de clubes e, inversamente, de os (novos) clubes contratarem jogadores, numa situação em que um jogador tenha rescindido o seu contrato sem justa causa". Como o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente, o recrutamento de jogadores de talento constitui "um dos parâmetros essenciais da concorrência em que os clubes de futebol profissional se podem envolver" (o que faz dos jogadores o "factor de produção" mais importante para os clubes).

“Assim, ao limitarem a capacidade dos clubes para recrutar jogadores, as disposições controvertidas em causa afectam necessariamente a concorrência entre clubes no mercado da aquisição de jogadores profissionais”. "Estes elementos constituem fortes indícios da existência de uma restrição da concorrência por objectivo. É evidente que existem outras situações em que os jogadores podem mudar de clube e ser recrutados. No entanto, tal não significa, como a Comissão sugere nas suas observações, que não exista uma restrição da concorrência por objectivo. Numa situação em que um contrato é rescindido sem justa causa, as disposições controvertidas foram concebidas para travar a concorrência. Não vejo como não equiparar esse cenário a uma restrição da concorrência por objectivo”.

Finalizaremos para a semana.

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