Dia da Visibilidade Trans: a visibilidade é importante mas será suficiente?

A política do medo e da desinformação em torno das questões trans mostra o compadrio com as posições homofóbicas e antifeministas do século passado.

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Um século depois do pioneiro dos estudos de género e sexualidade, Magnus Hirschfeld, ter publicado a obra Die Transvestiten (1910), na qual revelava as inúmeras possibilidades e variações de género, estabelecendo a diferença entre orientação sexual e identidade de género, as interpretações caricaturais sobre pessoas gays enquanto mulheres e de mulheres trans como homens potencialmente opressores — realidade particular dentro do movimento feminista trans-excludente mostram ainda resistir.

Verdade seja que nas últimas décadas, em Portugal e um pouco por toda a Europa, se assistiram a avanços legais em matéria de direitos de género e sexualidade. Entre 2011 e 2018, pessoas trans com cidadania portuguesa assistiram a um reconhecimento nunca antes possibilitado. Por força da pressão política de movimentos associativos e de partidos de esquerda, Portugal passa a reconhecer legalmente o nome e género de pessoas trans, permitindo a realização de modificações corporais, cirurgias e terapias de reafirmação de género gratuitamente, pelo SNS, e ao fim de diagnósticos médicos de “disforia de género” que determinavam, até 2018, a “autenticidade” das suas identidades.

Estaremos com o avanço das leis a mudar para uma sociedade melhor? Vivemos agora numa sociedade que respeita e que possibilita a representação positiva e realista das identidades e experiências trans e não binárias? Na verdade, os estudos indicam que enquanto a lei avança, a realidade social mostra continuar a ser atravessada pela resistência conservadora. Segundo o último relatório da ILGA Europa, os discursos de ódio transfóbicos continuam a aumentar por toda a Europa e também aqui, em Portugal, são percebidos nos meios de comunicação social, plataformas digitais online e, até mesmo, no parlamento português órgão representativo de todos os cidadãos portugueses discursos de ódio baseados na identidade de género (trans), entre os quais pelo partido político nacional conservador e populista de direita, Chega.

No último ano, as discussões em torno do projecto de lei que obrigava as escolas a garantir a identidade e expressão de género de crianças e jovens trans, nomeadamente no acesso a casas de banho e/ou balneários de acordo com o seu género auto-identificado, levou a uma onda de artigos e comentários anti-trans em canais de comunicação e informação online. A política do medo e da desinformação em torno das questões trans mostra o compadrio com as posições homofóbicas e antifeministas do século passado.

Os progressos e passos dados a favor do reconhecimento da integridade e autodeterminação dos corpos e identidades trans mostram hoje estar sobe fogo e ataque da força da extrema-direita que, recentemente, ameaçara reverter leis que qualificam como “ideologia de género”. Leis que garantindo cuidados de saúde, educação, o direito ao trabalho, à integridade física e psicológica destas pessoas sejam agora postas em causa. São uma vez mais os direitos das minorias os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, os direitos ao casamento e adopção por casais do mesmo sexo, o reconhecimento das identidades trans a não só não estarem garantidos como colocados em causa.

Hoje e mais do que nunca precisamos de promover a visibilidade trans. Precisamos de dar espaço a narrativas e experiências de vidas trans em Portugal, frequentemente representadas como vítimas ou agressoras, invisibilizadas pelo binário de género, e tão raras vezes reconhecidas pela sua coragem e ousadia em romperem com a compreensão eurocêntrica de género. Precisamos de compreender a diversidade desta comunidade e aprender com as suas histórias e experiências. Precisamos de continuar o trabalho que vem de trás e que falta cumprir: o acesso ao emprego, a cuidados de saúde dignos e gratuitos, a espaços educativos seguros, ao direito a habitação, em suma, ao direito a uma vida digna.

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