Não te sintas mal por causa da tua cadeira da roupa suja

As especificações da pilha de roupa – como o estado de limpeza – podem variar, mas precisamos de um tipo de espaço intermédio, que é o que a cadeira de roupa suja nos dá. Está na altura de assumirmos.

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É preciso um local intermediário para colocar as coisas às quais ainda não atribuímos uma categoria Getty Images
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Há quem lhe chame a cadeira da roupa suja. Mas nem sempre é uma cadeira a servir de repositório para o monte de roupa que fica no limbo a caminho da máquina de lavar. Pode ser um sofá-cama, um divã, em cima de uma cómoda ou uma bicicleta estática que está a ser usada para um tipo diferente de exercício. Se tiver uma superfície adequada para empilhar coisas, serve.

Algumas evidências anedóticas indicam que uma parte de nós tem algum tipo de cadeira da roupa suja – o mais famoso é Bernie Sanders. As especificações da pilha de roupa – como o tamanho, estado de limpeza – podem variar, mas precisamos de um tipo de espaço intermédio, que é o que a cadeira de roupa suja nos dá. Está na altura de assumirmos.

Antes do nascimento dos gémeos, que actualmente têm dois anos, Debora Crossley resolveu livrar-se da sua cadeira de roupa suja. “Disse ‘Não vou ter uma cadeira. Não quero passar isto.’ Por isso tirei a cadeira do meu quarto”, afirma. “Mas, de alguma forma, passou só para outro quarto.”

Entre o trabalho como administrativa (trabalha remotamente, a partir da sua casa em Temple Hills, no Maryland) e criar os seus filhos, os dias de Crossley estão preenchidos. Mas a pilha de roupa na cadeira não é o único indicador de que as suas prioridades são outras – na verdade, acha-a bastante útil. A pilha de roupa que não está assim tão suja para ir para a máquina está cheia de peças favoritas que estão prontas a ser usadas novamente. “Consigo ver o que está lá”, afirma. E quando fica demasiado desordenada, diz-lhe outra coisa: “É aí que sei que é dia de lavar a roupa.”

É aí que reside a parte genial de cadeira da roupa suja (ou, como chamo ao banco no meu quarto, “a montanha de roupa”). Pode até originar umas quantas questiúnculas dentro de uma relação, mas não chega a ser um sinal de caos – é uma forma de criar ordem dentro do caos. Tanto psicólogos quanto peritos em decoração concordam, apontando a necessidade natural de um local intermediário para colocar as coisas às quais ainda não atribuímos uma categoria, ou usá-lo como um local de preparação para aquilo que pode vir a ser útil num futuro próximo. A pilha de roupa pode salvar-te de lavar demasiado as peças que não precisam. Além disso, há uma uma previsibilidade confortável neste ciclo: assim que acabas com a pilha, já libertaste espaço suficiente para que se crie outra montanha de roupa.

“Quando tens a pilha, é porque a confusão está consolidada, certo?”, afirma Sally Augustin, responsável na Design with Science, que encontra e recomenda designers com base na investigação em neurociência. A cadeira da roupa suja deixa que olhemos para nós próprios como pessoas que começaram a tentar completar uma lista de coisas por fazer, cada vez maior. “Quando tens uma cadeira destas, já começaste a agir.”

Para Joseph Ferrari, professor de Psicologia na Universidade DePaul, que estuda a desordem e a procrastinação, a parte da “acção” é fundamental. Também reconhece que uma cadeira de roupa suja pode servir para organizares a tua vida. Mas desconfia de uma pilha que fica no mesmo sítio durante demasiado tempo. “Se calhar, para mim, é uma questão maior”, afirma. “Se tens a pilha ali, será que vais tratar dela?”. Se a resposta for sim, mais poder para ti.

Até as pessoas que ganham a vida a tornar as casas mais bonitas são testemunhas da virtude de uma cadeira da roupa suja. Cristopher Boutlier, designer de interiores de Washington DC, diz que a cadeira da roupa suja é “absolutamente inevitável”. “É um local conveniente para por alguma coisa enquanto debates, na tua cabeça, o que vais fazer com ela.”

Quando cria espaços para clientes, Boutlier tenta ajudá-los a minimizar a confusão ao incorporar cestos e arrumadores. Mas é céptico que essas peças consigam mesmo mudar hábitos: “Mesmo que haja uma opção conveniente, o nosso padrão tende a anulá-la”. No fim de contas, Boutlier também tem a sua pilha.

Pensa no teu montinho como uma lista de afazeres visual, uma vez que muitas vezes inclui peças que provavelmente precisam de ser lavadas a seco e outras que estás a considerar doar. Diz que a ideia de fazer essas coisas em breve é “delirante”. “Completamente. Mas, no grande esquema das ideias delirantes, é daquelas que não faz muito mal.”

De forma surpreendente, o perito em lavagem da roupa Patric Richardson, autor do livro House Love: A Joyful Guide to Cleaning, Organizing, and Loving the Home You’re In, celebra o conceito de uma cadeira de roupa suja. Está sempre a aconselhar as pessoas a lavar menos a roupa, pois podem estragá-la, e esta é uma peça de mobiliário que consegue prevenir isso. “Se alguém consegue reutilizar alguma coisa ao fazer isso, estou totalmente de acordo. Seja uma cadeira ou uma mesa”, afirma.

Embora seja um apoiante do conceito, Richardson – talvez a única pessoa do planeta que gosta mesmo de arrumar roupa – não achava ter a própria versão. Mas, durante a nossa conversa, revelou a existência de um banco no quarto onde coloca as calças de ganga todas as noites. Tive de lhe dizer: até uma cadeira de roupa suja minúscula conta.

E, na verdade, não abraçamos essa área cinzenta – o meio-termo – noutras áreas da vida? É assim que Wyatt Yankus, analista de geopolítica que vive em Washington DC, olha para a cadeira da roupa suja, uma característica da casa que considera “vital”. Tem uma desde que era miúdo (para desânimo da mãe) e, depois de tanto tempo, desenvolveu uma teoria sobre o seu propósito: “A forma como as pessoas falam dos cafés como sendo um terceiro espaço entre a casa e o trabalho, é assim que eu penso na cadeira da roupa suja, como um terceiro espaço entre a gaveta e o cesto.”


Exclusivo PÚBLICO/ The Washington Post

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