A importância da COP15

Os objectivos discutidos nesta COP15 sobre as estratégias de conservação da biodiversidade até 2030 não serão alcançados sem mudanças transformadoras do ponto de vista económico, social e político.

Há pouco mais de 15 dias, Ricardo Garcia lembrava que a COP tinha já entrado no léxico comum. Mesmo não sabendo bem o significado - Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas - entendia-se a importância da discussão, realizada ao mais alto nível, sobre as consequências das alterações do clima para o “nosso futuro”. Os eventos desastrosos já se fazem sentir. Mas, ao contrário do que se possa pensar, a “marca” COP não é exclusiva das Alterações Climáticas. Neste momento está a iniciar-se uma outra COP, a 15, para a Biodiversidade, ou seja a Cimeira das Partes da Convenção da Diversidade Biológica das Nações Unidas. O que é que isto significa e porque é que isso nos deve preocupar?

Proteger a biodiversidade é do nosso interesse. A Biodiversidade – a diversidade dentro da mesma espécie, entre espécies e ecossistemas – está a diminuir a uma velocidade vertiginosa. De acordo com a Plataforma Intergovernamental para a Biodiversidade e Serviço dos Ecossistemas (IPBES, da sigla inglesa) desde 1970 até hoje, a produção de alimento e madeira aumentou 45%, com a indústria florestal a gerar cerca de 13,2 milhões de empregos. No entanto, os indicadores de regulação como a quantidade e qualidade de solo e a diversidade de polinizadores diminuíram, indicando ganhos insustentáveis.

A quantidade e qualidade de variedades de plantas e animais da nossa dieta alimentar tem vindo a ser progressivamente diminuída com repercussões na segurança alimentar. A degradação das paisagens reduziu a produtividade em 23% e a perda de polinizadores está a aumentar essa redução. Actualmente, 75% das paisagens estão alteradas, 66% do oceano recebe impactos cumulativos e cerca de 85% das zonas húmidas desapareceram. A perda de habitats costeiros e recifes de corais tem diminuído a protecção da costa aumentando o risco de cheias e tempestades, colocando em perigo as populações.

O grande desafio actual é, por isso, entender que alterações climáticas, perda de biodiversidade, degradação da paisagem e poluição estão interligadas. As alterações climáticas exercem um impacto negativo não só no Homem mas também na distribuição das espécies, dinâmica das populações e função dos ecossistemas, com perdas de resiliência e capacidade de retenção de carbono. A poluição, o fogo e as espécies invasoras aumentam os efeitos negativos sobre os recursos naturais, e afectam toda a cadeia alimentar e a economia global.

Os recursos biológicos são os pilares sobre os quais construímos civilizações e que suportam indústrias tão diversas como agricultura, cosmética, farmacêutica, papel, madeira, entre outras. A perda de biodiversidade ameaça a nossa dieta alimentar, a nossa oportunidade de recreação e os serviços ou bens que o ecossistema nos fornece, como a capacidade de sorvedouro de carbono, a regulação hídrica, a retenção e contenção do solo e despoluição do ar.

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Não interessa implementar políticas de florestação em zonas pós-fogo, se não se limitar o tipo e uniformização da floresta Tiago Lopes

A noção de serviços ou bens foi lançada em 1997 por Costanza com o objectivo de dar ao espaço natural uma visão económica. Os serviços são considerados os benefícios proporcionados pelos ecossistemas ao Homem. A noção de desenvolvimento está muito ligada à expansão económica que se sobrepõe aos interesses da conservação dos recursos biológicos. A incorporação dos múltiplos valores que a natureza nos fornece poderia contribuir para a sustentabilidade ecológica, económica e social.

Os objectivos que irão ser discutidos nesta COP15 sobre as estratégias de conservação da biodiversidade até 2030, não podem ser alcançados sem mudanças transformadoras e efectivas do ponto de vista económico, social e político. Do protocolo de Nagoya (Japão), em 2010, onde se geraram as metas de Aichi, muito pouco foi alcançado. Reduzir as pressões directas sobre a biodiversidade e promover o uso sustentável, aumentar os benefícios da biodiversidade e dos serviços do ecossistema e desenvolver medidas estratégicas através do planeamento participativo e gestão do conhecimento, foram praticamente ignoradas.

Os objectivos do desenvolvimento sustentável nunca poderão ser alcançados se não existirem políticas consistentes para reduzir a perda de diversidade e a degradação e uniformização das paisagens. A natureza pode ser conservada, restaurada e usada de forma sustentável, desde que sejam desenvolvidos esforços de transformação política e social.

Em Portugal, os esforços políticos vão no sentido de assegurar a protecção e conservação dos sítios da rede Natura. Mas deviam cobrir todas as áreas onde haja habitats que desempenhem papel vital na conservação da biodiversidade e na diversificação das paisagens. Não faz sentido continuar a não regular o crescimento indiscriminado de “resorts”, ditos ecológicos, sacrificando e degradando a nossa zona costeira, que constituem barreiras naturais à subida das águas do mar. Não interessa implementar políticas de florestação em zonas pós-fogo, se não se limitar o tipo e uniformização da floresta. Zonas de leito de rios e zonas húmidas marginais devem ser mantidas e controladas a fim de poderem funcionar como sorvedouros de carbono e apoiar as medidas de neutralidade carbónica.

As medidas sociais estão directamente relacionadas com a quinta meta de Aichi que ficou por cumprir: incentivar a população para a necessidade de mudança de comportamento, quer nas práticas de consumo, quer na diversificação da sua dieta alimentar, implementando uma comunicação eficiente e sistemática sobre os benefícios de usufruir e conservar a natureza. Talvez seja um bom augúrio as discussões finais da COP 15 serem nesta época do Advento já que, de acordo com a Bíblia, é um período de esperança, que convida a não desistir nem resignar. Haja esperança!

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